Wolf Children - O poder do amor de uma mãe
- Lucas Frazão-kun
- 24 de ago. de 2018
- 4 min de leitura

Em um país como o Brasil, a realidade da “mãe solteira” pode ser bem mais comum que imagina. Segundo o Instituto Data Popular, 31% do totais de mães no Brasil são solteiras. Esta realidade começa cada vez mais atingir sociedades distintas das nossa, como o Japão. De acordo com o Ministério da Saúde e Bem-estar Social do Japão, o número de mães solteiras aumentou para 1.238.000 milhões (dados referentes a 2011). Outra coisa que chama atenção é o fato de a maioria dessas mães viverem na linha da pobreza, ganhando menos da metade da média relacionada a todas as famílias japonesas.
É neste contexto que em 2012 é lançado o filme Ōkami Kodomo no Ame to Yuki (Wolf Children), do Studio Chizu em parceria com a Madhouse e dirigido por Mamoru Hosada.
É interessante notar que se trata do primeiro filme criado pelo Studio Chizu, fundada pelo próprio diretor do filme, Mamoru Hosada, e o produtor Yuichiro Saito em 2011. Hosada já tinha experiencia em dirigir longas (Digimon: O Filme e Summer Wars), mas Wolf Children foi sua primeira obra original com suas marcas e mão autoral.
Sinopse:
Hana se casou com um lobisomem e teve dois filhos, Yuki e Ame. Depois de anos felizes, seu marido morre e ela percebe que as crianças têm a mesma característica do pai. Agora Hana deve encarar os desafios de criar sozinha seus filhos e lidar com suas características especiais, onde seus desejos e escolhas determinarão seus destinos.
Um filme lindo, começando por seu visual.

Como toda animação, a estética e design de produção são as características de primeira percepção do telespectador. Wolf Children, como primeira grande produção de um estúdio novato, consegue transmitir uma qualidade digna de estúdio grande. As cores leves e frias trabalham constantemente com o clima de cada cena, onde ela se permite ser mais vibrante e forte nos momentos propícios.

Mais que cumprir a função de ser “bonito”, o design tem uma função simbólica e visual, alimentando a narrativa e encontrando o tom que uma história como essa precisava. Sem falar da qualidade de animação, onde os personagens conseguem ter uma forma simples na sua concepção, mas ao mesmo tempo contrastante com o resto dos “figurantes”, principalmente na primeira sequência onde se passa na cidade. Hana, a mãe, é propositalmente feita de maneira simples, diria até “fragilizada”, para que ela possa servir como um avatar das mães solteiras do país, criando um laço de identificação.
Ficou claro que a riqueza dos simbolismos visuais teve como inspiração as grandes obras do Studio Ghibli, onde cada elemento presente tem significado e propósito. Palmas para Hosada.
Uma obra autoral, afinal.
Lógico que não basta o aspecto técnico da animação ser bom. O diretor tem a responsabilidade de dar forma e consistência na narrativa, com ângulos, trabalho de personagem e cortes. Nisso, Wolf Children é uma aula e falarei o motivo.
Começar que Hosada sabe muito bem o que deve ser contada nesta história. Ele consegue dar ritmo e relevância para cada momento como deve ser. Um exemplo disso é logo no início, onde ele constrói a relação de Hana e seu marido (que não tem um nome apresentado, simbolizando a certidões de nascimento onde não tem um nome do pai registrado) praticamente com uma sequência de cenas e quase sem diálogos. Aliás, é um filme que se utiliza muito pouco diálogos. Esta sacada foi genial pois ajuda a criar um clima de solidão e agonia, refletindo a circunstância de mãe jovem e solteira.
Outro momento que chama atenção é no início do filme, quando começa a luta de Hana de criar seus filhos sozinha. Hosada coloca seus “figurantes” quase que em outro plano, e muitas vezes cortados e sem seus rostos definidos.
Isso é para separar a realidade distinta e difícil de Hana do mundo ao seu redor, como se aquelas pessoas fossem seres de “fora” do seu ambiente. Com certeza Hosada provou neste filme todo seu talento e maestria na técnica de se contar uma história. Falando nisso, e sobre o que é a história?
O poder do amor de uma mãe.
Acho que ficou claro aqui que Wolf Children é um filme sobre mãe solteira. Pode-se abranger mais este tema e dizer que também é sobre criar filhos com “condições especiais”. É muita mensagem e narrativa que existe dentro do filme, mas o que mais me pegou e que motivou a escrever esta crítica foi a personagem da Hana e o que ela representa. O filme que é narrado pela Yuki, a filha mais velha, começa falando que vamos descobrir a história da sua mãe que, tirando o fantasioso e lúdico, é a história de inúmeras mulheres do mundo.
Hana passa por inúmeros desafios, tendo que entender as condições de seus filhos por ela mesma, sem a presença do pai para orientá-la. Um momento muito bom do filme e que exemplifica sua luta é quando sua filha adoece, onde Hana fica confusa se leva sua filha ao veterinário ou ao pediatra. Embora tenha um tom cômico, esta cena deixa Hana desesperada, sem poder contar com ninguém.
Outro ponto levantado é o preconceito da sociedade japonesa com a mãe solteira. Hana não pode ter auxílio muitas vezes por conta do medo de descobrirem que seus filhos podem virar lobos, obrigando-a a se isolar socialmente boa parte do filme. Este ponto faz Hana sofrer certas ofensas e falta de compaixão. Hosada quer levantar o debate e mostrar este preconceito da sociedade japonesa com a mãe solteira e isso faz o filme ter uma relevância que vai muito além do entretenimento.
Wolf Children é uma obra-prima que merece futuramente ganhar um status de clássico da animação. Após assistir esse filme, dá uma vontade de abraçar sua mãe e agradecer por todo carinho e apoio que ela te deu ao longo da sua vida.

Informações:
Estúdio: Chizu
Direção: Mamoru Hosada
Gênero: Fantasia, drama
Duração: 1 hora e 57 minutos
Ano: 2012
Nota: 10/10
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