Feios: uma história distópica e reflexiva
- Louise Biolchini
- 4 de set. de 2018
- 3 min de leitura

A maioria dos livros com foco em distopias partem do ponto onde a humanidade perdeu o controle de suas próprias vidas, seja por catástrofes aleatórias ou provocadas, ou talvez têm um preceito que o mundo nunca fora como é agora, desde o começo o homem já era distópico.
Porém, caro leitor, esta é a primeira vez que eu encontro um livro sobre uma distopia da beleza, ou nesta caso, uma ilusória utopia - que será melhor descrita abaixo. Durante a leitura desse gênero é fácil de se perder e esquecer conexões com a realidade, embora este ponto é, de fato, um dos tópicos mais contemplativos deste. Porém em Feios há uma realidade presente o tempo todo e uma comparação constante de como a Ditadura de Beleza pode chegar a fins exacerbados, assim como em qualquer ditadura - embora as consequências desta já são reveladas e evidentes, como doenças psicológicas, há um ponto cego de discussão. Logo um livro escrito por um homem a respeito do que é a beleza de fato e qual é o real problema dessa procura cega por uma perfeição inexistente, é algo inesperadamente feliz.
No mundo de Tally os "enferrujados" - pessoas com estilo de vida não auto-sustentável e cuja o preconceito por aparência era algo rotineiro - já foram extintos em seu própria cobiça e agora há uma nova sociedade sustentável, respeitadora do meio ambiente e, acima de tudo, igualitária. Ao menos na aparência: aos 16 anos todos os cidadãos passam por uma cirurgia para conseguirem uma aparência apelidada de perfeita, para assim não haver distinção entre os homens e todos possam viver em harmonia.
Porém enquanto não passa por esta cirurgia, Tally vive em Vila Feia, onde os jovens - após saírem da casa dos pais - vivem até chegar a idade da cirurgia, onde se mudam para Nova Perfeição - onde a entrada, aproposito, é proibida. E embora os "novos perfeitos" possam visitar seus amigos em Vila Feia quando quiserem, eles nunca voltam.
Um dia Tally conhece Shay uma menina que, diferentemente do resto da população, não deseja fazer a cirurgia, pelo contrário, mesmo sendo considerada feia por todos - até mesmo pelos seus iguais - está satisfeita com a própria aparência e ao perceber que será forçada a passar por esse procedimento decide fugir para Ferrugem, uma suposta comunidade para onde "feios" fogem do governo para manter a própria aparência.
Porém quando o governo exige saber a localização de sua nova amiga, do contrário impossibilitará a cirurgia, Tally é forçada a procurar por ela, infiltrada. Tudo para conseguir sua beleza.
"Não há beleza perfeita que não contenha algo de estranho em suas proporções"
Francis Bacon
O termo "Ditadura da Beleza" nunca foi tão atual, porém não se implantou literalmente, a não ser no romance de Scott Westerfeld - onde parece utópico que jovens possam se tornar bonitos inquestionavelmente, sendo educados a não questionar a sorte com que foram nascidos.
Entretanto não percebem a imposição de tal ritual, onde qualquer aparência é feia - pois há uma comparação clara com um ideal projetado. Há um não reconhecimento da própria beleza natural, onde ela só existe na similaridade de algo não-natural. E qualquer detalhe que fuja é considerado horrendo, mais do que isso as crianças são ensinada a se odiarem - e isto não poderia ser tão longe da nossa realidade. Embora não haja uma "cirurgia mágica" nos imposta e não moremos na Vila Feia, o fato é o os ideais existem e nos são impostos desde que nascemos - onde não podemos ver a beleza dos detalhes não conformativos e não deveríamos: a sociedade gira em prol de uma busca incansável por uma beleza inexistente.
Procurando um exagero verossímil o autor consegue criar uma história onde as aparências "perfeitas" escondem segredos obscuros: uma aventura para os jovens não conscientes e uma nova perspectiva para aqueles que já se acostumaram a se achar feios.
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